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Como pensar como um futurista

O que aprendi num fim de semana com Jane McGonigal

8 min readMay 16, 2019

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No primeiro final de semana de maio estive no workshop How to think like a Futurist da Jane McGonigal, em Stanford, e tive a oportunidade incrível de aprender alguns passos valiosos pra mudar minha forma de pensar e ficar mais conectada a tendências do que vem por aí.

O Futurismo aqui não é aquele movimento literário e artístico de 1909 que tentou mudar os padrões da sociedade (lembra?), mas uma forma de coletar sinais de novas realidades que começaram a aparecer no presente que vão mudar nosso jeito de viver no futuro.

Pensar como um futurista é desenvolver a capacidade de identificar sinais do presente que apontam pra mudanças significativas no futuro, conseguir formular alguma provocação (que chamamos de forecast) que defina essa nova situação do futuro, e estimular o pensamento de forma a enxergar as consequências positivas e negativas desse potencial futuro.

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Primeira grande regra: Nunca tente predizer o futuro corretamente. Quando se lida com o futuro é mais importante ser imaginativo do que correto, segundo Alvin Toffler.

Não é sobre fazer previsões acertadas e definir o que vai acontecer na próxima década. Na real, quanto mais próximo de mãe Dinah você se sentir, menos futurista você é. É mais sobre levantar possibilidades e estudar de que formas elas se desdobrariam, tendo plena consciência de que são possibilidades e não realidades. O que vale aqui são os chutes, que quanto mais bem estudados e analisados, mais certeiros tendem a ser. Essa forma de pensar todo antenado no que já tá rolando e pode se tornar uma realidade no futuro é chamada de Future Thinking.

Eis um resumão do conteúdo que a “gênia” Jane ensinou. Não posso compartilhar todo o material, mas segue um gostinho do que foi esse final de semana intenso. Quer pensar como um futurista? Então, siliga nesse passo a passo:

1. Escolha seu próprio futuro

Como a noção de futuro pra cada um é diferente, no Futurismo costuma-se pensar no padrão de 10 anos a partir de hoje. Como a cada dia o processo de mudança do mundo está mais acelerado, capaz que esse período de tempo mude também daqui uns anos. Mas uma década é o padrão atual porque é entendido como tempo suficiente para as coisas mudarem significativamente na sociedade. Coisas que parecem impossíveis ou improváveis, em 10 anos podem se tornar reais. O Facebook, por exemplo, em 10 anos saiu de 1 usuário pra 10 milhões. E você, o que pode fazer em 10 anos?

Quanto mais eficácia própria o futuro que você imagina tiver, mas provável que o futuro que você imagina aconteça de fato. O chamado Future self-efficacy é a habilidade de antecipar possibilidades, fazer escolhas e agir hoje pra que se tenha mais poder pra determinar como o futuro vai se tornar. O auge dessa eficácia é quando você se sente agente da mudança a ponto de trocar a frase Eu tenho visto o futuro (I have seen the future) por Eu estou fazendo o futuro (I am making the future).

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Essas skills são a chave pra se tornar um bom futurista.

Existem 4 formas de aumentar a eficácia do futuro que você imagina:
1. Predição: perceber o que está vindo;
2. Simulação: imaginar o que é possível, simulando contextos e consequências;
3. Intenção: desenhar futuros preferidos;
4. Ação: é quando você é capaz de influenciar outros e criar estratégias para fazer futuros se cumprirem. Essa skill é muito poderosa.

2. Jogue com os sinais

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Sinais são o material bruto de um futurista: são exemplos específicos do futuro no presente. Eles costumam ser entendidos como dicas que algumas coisas talvez se tornem outras coisas em breve.

Ela deu o exemplo do sinal de “no drone zone”. Essa é uma realidade prevista por quem estava mais atento anos atrás, no momento que os drones começaram a aparecer. Uma nova tecnologia sempre traz prós e contras. No caso dos drones voando sobre nossas cabeças em locais públicos podemos pensar sobre questões como privacidade, desconforto e outras. Dava pra prever que em algum momento seria necessário sinalizar a restrição em algumas áreas.

Da mesma forma, tem muita coisa hoje que sinaliza mudanças de grande impacto na vida no futuro. O futuro já está entre nós, só não muito bem distribuído, já diria William Gibson.

The future is already here. It’s just not very evenly distributed. — William Gibson

Antes de partir pro próximo passo, Jane nos mostrou esse vídeo pra mostrar que tudo tem seu lado positivo e negativo e que precisamos pensar em ambos os lados pra analisar uma situação direito. Gaste seu inglês aí:

3. Pensamento divergente

Nesse momento do workshop, exercitamos como coletar sinais do futuro, como combiná-los e torná-los uma provocação, e levantar desdobramentos positivos e negativos (que Jane chamou de Positive Thinking vs Shadow Imagination).

Como analisar sinais
Se você identifica um sinal (por exemplo: reconhecimento facial ou IoT bem difundidos no mundo), pode avaliar fazendo algumas perguntas:
1. Que tipo de mudança esse sinal representa? O que é e o que será?
2. O que está dirigindo essa força de mudança? Qual a força por trás dela?
3. Como o mundo pode se parecer em 10 anos se esse sinal se materializar e ficar maior? E se for comum?
4. É esse futuro que quero ajudar a criar?

Onde procurar por sinais
Jane nos deu dicas de onde ficar de olho pra ver os sinais aparecendo:
-
Google! Buscar por “The future of X” é o seu melhor amigo.
- Tem alguns sites especialistas em compartilhamento de descobertas científicas e avanços tecnológicos numa linguagem acessível, como o Science Daily e MedicalXpress. MIT Technology Review e Wired são bons também.
- Ficar antenado em novidades de startups e grandes empresas de tecnologia pelo TechCrunch e Geekwire.
- Seguir futuristas nas redes sociais.
- Perguntar nas redes: o que vocês têm visto de interessante ultimamente que se parece com coisa do futuro?
- Analisar bibliotecas de sinais maravilhosas como essa: https://futurism.com/the-byte

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Como criar forecasts a partir de sinais
Forecasts são provocações não predições, elas são plausíveis mas não inevitáveis. Por exemplo: acredita-se que em breve não será possível roubar. Por que? Os sinais Iot (tudo geolocalizado) com reconhecimento facial (mais fácil de reconhecer criminosos) e moeda digital (não pode ser roubada fisicamente) juntos conduzem a uma realidade diferente dos crimes no futuro. Como isso se desdobraria?

Características de um bom forecast
-
É possível: você tem uma evidência? Liste e linke com sinais e direcionadores.
- É provocativo: quando você comenta essa provocação, alguém para e pensa? A conversa rende?
- É plausível mas não inevitável: qual o caminho pra esse futuro? Quem vai trabalhar pra torná-lo real? Existe algo pra pará-lo ou mudá-lo?
- O que ficará mais ou menos comum nos próximos 10 anos?
Encontre pessoas que teriam um papel claro nesse forecast e as entreviste.

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- Identificar dois lados de cada futuro forecast com:
Shadow imagination: o que nos preocupa sobre o contexto;
Positive imagination: o que nos anima nesse contexto.

Quando você tem uma possiblidade de futuro na cabeça, procure por sinais que fazem o forecast mais ou menos confiável. Pra isso, você precisa imaginar como as coisas seriam diferentes. O futuro é um lugar onde tudo pode ser diferente. Se você imaginar uma cena do seu passado e mudar algum elemento, já é uma possibilidade do futuro. Quer ver só?

Pense em algo que você ama fazer (X), uma pessoa com quem você se importa (Y) e um lugar distante preferido (Z). Daqui um ano seria possível você fazer X com Y em Z? Se isso nunca aconteceu, é uma possibilidade de futuro que você deseja. Agora muda um dos elementos (X, Y ou Z). Já muda tudo, né? Esse é um exemplo de futuro baseado na sua memória do passado.

Agora imagina o que vai ser o casamento daqui 10 anos. Você acha que muda muita coisa? O que? Por que? Como você gostaria que esse futuro fosse? Você pode fazer algo a respeito desse futuro? Dá uma olhada nessa simulação de um futuro provável do casamento:

Se quiser saber os desdobramentos dessa pesquisa sobre o futuro do casamento, clica aqui.

4. Previsões pessoais

Já parou pra pensar que você daqui 10 anos é um estranho pra você de agora? Tente imaginar você dentro dos contextos de futuro que imagina. Pratique o positive thinking e a shadow imagination. Você sabe como poderia utilizar seus talentos pra impactar de alguma forma o futuro que imagina?

Jane apontou que costumamos ter mais empatia com os outros do que com o nosso eu do futuro. É triste isso, né? Imaginar o nosso futuro pode direcionar o jeito de fazer e nos ajudar a reposicionar de acordo com o tempo (e life design é sobre isso).

5. Storytelling + criação de imagens

Aqui é o passo pra descrever os futuros preferidos. Um futuro preferido é aquilo que quero que seja, não significa que vai acontecer de fato. Cuidado que aqui não valem desejos mágicos ou utopias vagas. Ainda é sobre pensar em algo provável de acontecer, com aquela vontadinha extra de “ah, isso ia ser tão maravilhoso se acontecesse”.

Nessa etapa, cria-se uma pequena história do futuro preferido, encontram-se imagens desse futuro (nas bibliotecas de sinais tem um bocado) e é possível imaginar alguns artefatos (que são uma combinação dos sinais com objetos) desse futuro.

6. Imaginação coletiva

Uma vez trabalhando futuros preferidos, é bom colocar em análise por diversos pontos de vista. Jane distribuiu um framework tipo um mind map, em que alguns futuros preferidos ficavam no centro e se desdobravam em consequências. Ela chamou essa ferramenta de future wheel, onde desenhamos consequências e subconsequências de cada situação. É importante sempre pensar em desdobramentos que nos surpreenderiam, animariam e preocupariam.

Pra finalizar, Jane nos mostrou um estudo sobre o futuro da empatia. Já imaginou se você conseguisse sentir exatamente o que outra pessoa sente? Seria incrível? Perturbador? Assiste aí pra tentar se colocar nesse contexto:

Clique aqui para mais detalhes desse estudo interessantíssimo (meu preferidinho).

O curso foi super produtivo, cheio de ideias muito diferentes, muita informação sobre novas tecnologias e possibilidades de combinação entre elas. Sabe aquela aula que muda a vida da pessoa? Então. Prazer, sou a Livia do Futuro, risos.

Usar Future Thinking é uma oportunidade de ser criativo e antecipar nossa participação ativa em questões relevantes do mundo. Vamos trocar ideias e exercitar o pensar e o agir pelo futuro que queremos. Tem muita questão mundial crítica que precisa de gente talentosa e antenada pensando soluções.

Se quiser saber mais, comenta que tô aqui à disposição de espalhar o conhecimento adquirido. E se curtiu, não esquece de aplaudir! 🥰

☂️

Chuva de links pra vocês:
Um compilado de futuros imaginados: Journal of Future Studies
Uma história do futuro em objetos:
A history of the future
Instituto para o Futuro
TED da Jane McGonigal:
The future is dark (and that is a good thing)
SXSW Keynote da Jane McGonigal:
How to Think (and Learn) Like a Futurist

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Livia Holanda
Livia Holanda

Written by Livia Holanda

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